Steven Universo: Futuro - um final que parece final

 

Steven Universo: Futuro (2019) © Cartoon Network


A belíssima saga de Steven Universo chegou ao final com a temporada Steven Universo Futuro, que mostra o que aconteceu depois do filme (Steven Universo: O Filme). Eu não poderei falar desse final sem dar spoilers, então se você ainda não assistiu essa última temporada, corre que dá tempo!

Após salvar o universo, Steven e as cristal gems criam na terra uma escola para as gems que foram corrompidas. O objetivo é adaptá-las à nova realidade: gems não são mais súditas das Diamantes, e a pratica colonizadora da Terra Natal (Homeworld) encontrou seu fim. Elas precisam aprender a viver a liberdade.

Steven busca então fazer o que sempre fez ao longo da história: resolver os problemas dos outros. Ele se sente um tanto quanto inútil por não precisar fazer mais o que ele fez todos esses anos, que é salvar o universo. Mas suas ideias de como devem viver as gems nessa Nova Era nem sempre condizem com o que as gems querem. Nem todas querem (ou precisam) sair das suas zonas de conforto para serem realmente livres.

Seus amigos também parecem seguir suas próprias vidas, e Steven passa a vivenciar o medo de ficar sozinho. Sadie encontra um novo amor e decide partir em turnê, e Lars, que não está mais namorando Sadie, decide voltar para o espaço e se aventurar.

Para alguém que passou tanto tempo olhando os problemas do seu entorno, Steven acumulou algumas questões pessoais também. O sentimento de não ser útil aos outros é apenas uma delas. Há outras, como a dificuldade de interação com outros humanos, principalmente os da idade dele (amigos da Connie), já que Steven conviveu desde criança com as gems. Ele não sabe conversar sobre escola, provas e outras coisas de crianças e adolescentes comuns. Além disso, ter participado da luta contra as Diamantes por todos esses anos gerou traumas nele.

Steven tem medo de se abrir com os outros para lidar com esses traumas, e acaba se fechando cada vez mais. Para piorar a situação, seus poderes de Diamante começam a aflorar, e ligado aos traumas mal resolvidos, ele se descontrola. Se torna literalmente um monstro, e nem as outras três Diamantes têm poder de vencê-lo. Até entenderem que aquele monstro é só um adolescente confuso. E que precisa de amor.

E aí nos encaminhamos para o episódio final, que agradou alguns fãs e desagradou outros tantos. A questão é que, para mim, Rebecca Sugar nos entregou um final de verdade, ainda que tenham ficado algumas pequenas questões em aberto. E por isso, assistir esse episódio final não é tão confortável. Acredito que muitos esperavam que Steven ficasse em Beach City com as gems, Connie e seu pai, Greg. Mas vendo que cada um ao seu redor tinha sua própria vida e seguia seu próprio caminho, Steven percebe que ele também precisa passar por esse processo – que não é tão original assim, já que ele escolhe fazer o que o pai dele fez quando era jovem também.

Steven decide sair de casa e viajar pelo país de carro, explorando e conhecendo o mundo que o cerca. Ele marca de se encontrar com Sadie, Lars e Connie pelo caminho, mostrando que é possível seguir sua vida e partir em sua jornada sem estar necessariamente sozinho nela. Seguir seu próprio caminho parece uma tarefa assustadora, e é verdade que existem passos que só você pode dar por você mesmo. Mas isso não significa que ao longo desse caminho você também não possa andar de mãos dadas.

Eu me senti como Garnet, Pérola e Ametista quando Steven releva que vai sair de casa. Eu já tinha aceito que a história acabaria. É o fim de Steven Universo, essa história tão linda e que me cativou de uma forma especial. Mas ainda não tinha sentido o baque, não tinha caído a ficha que era realmente o fim. E assim como as gems, eu ouvia que Steven partiria sem derramar lágrimas. É uma decisão dele, e vai lhe fazer bem, afinal de contas. 

Mas, cara, é fim de Steven Universo! Dessa história que mostrou uma representatividade sem igual nos desenhos, cheia de grandes lições de amor, amizade, positividade, aceitação do outro e de quem você é, compreensão, resolução de conflitos e outras tantas coisas. Das músicas icônicas que ouço até hoje (como Aqui Foi um Pensamento, que é ótima para momentos de reflexão).

Sim, isso é um final. E Rebecca nos dá um final que é desconfortável de certa forma, principalmente levando em conta que a história ao longo de todos esses anos foi bastante confortável (em termos de enredo, resolução de conflitos, fanservice). Ela nos entrega um final maduro. Steven não é mais aquela criança que nos acostumamos. Ele cresceu, assumiu novas responsabilidades e tomou as rédeas da própria vida.

E dói vê-lo partir. É triste a despedida da sua família, a verdadeira despedida, onde todos se permitem chorar – e eu choro junto com eles. Despedidas são assim, pode demorar para cair a ficha do que realmente está acontecendo. Quando a ficha cai, você percebe que aquilo foi um adeus. E cabe lidar então com aquela sensação de perda, de vazio, de algo que estava aqui e não está mais.

Na minha avaliação foi um belo final, digno de uma história que teve a coragem de tratar temas tão importantes com leveza e delicadeza. O que Rebecca entregou foi um trabalho que marcou uma geração. E mesmo que Steven tenha que partir, e a história tenha que acabar, ela segue com todos aqueles que ela foi capaz de tocar, de encantar e de ensinar algo. Eu encerro com uma das falas finais de Garnet para Steven, que me pareceu a Rebecca falando conosco:

 

Mas eu também vi vários caminhos à sua frente. E nós somos parte de todos eles”.

 

Porque sua arte é importante (e você deveria publicá-la)

 



No curto tempo em que fui estudante de Artes Visuais uma questão sempre me preocupou: por quê os trabalhos que eu faria seriam de alguma forma importantes? Toda arte é filha do seu autor e, portanto, possui aí sua dose de subjetividade, de sentimentos e de história de vida desse artista. Ela é reflexo de sua visão e nasce a partir de uma intencionalidade.

Há obras que representam a felicidade, a esperança, a solidão ou a melancolia. Ora, por que alguém iria a uma galeria de arte ver a expressão de sentimentos, visões de mundo e histórias de vida de autores desconhecidos? E mais, por que comprariam essas obras e as colocariam em suas casas ou locais de trabalho?

Talvez a melhor pergunta seja: o que faz uma obra de arte ser importante para alguém (além de seu autor)? Existe claramente a afinidade estética, gostamos do que achamos bonito. Mas uma obra é mais complexa do que isso. Ela tem história, intencionalidade e evoca sentimentos. Um belo soneto é mais do que suas rimas. E a arte não precisa necessariamente ser bonita (do ponto de vista do observador) para ser marcante.

E é possível que eu não consiga chegar numa resposta clara e definitiva para essa questão. Mas anos depois de ter tido essas preocupações, consegui encontrar alguns caminhos de interpretação.

Em primeiro lugar, a arte é importante por si só como forma de expressão. É importante se expressar numa sociedade que viveu mais de trezentos anos de um regime escravista, e que há algumas décadas atrás enfrentava a censura de um regime ditatorial. Tentaram calar nosso povo, mas ele nunca deixou de se expressar através das brechas que encontrava no sistema. O fantasma da censura continua a assombrar, e lembranças de dias difíceis de outrora pairam sobre nós.  Mas como diz a música O bêbado e a equilibrista: “o show de todo artista/ tem que continuar”.

Em segundo lugar, tem algo que buscamos na arte. A experiência estética com certeza está presente. Mas me parece também que buscamos sentir algo. A comédia nos faz rir, o drama nos emociona, a aventura nos enche de coragem e excitação, a fantasia nos transporta para outras realidades, o terror nos faz temer e sentir que estamos vivos, as obras religiosas nos trazem consolo. A arte nos toca e nos traz emoções, evoca sentimentos.

Mas eu sou um artista desconhecido, pode meu trabalho tocar alguém? Evidentemente que sim. Porque nós, seres humanos, temos a capacidade de cativar os outros e sermos cativados por eles. Eu posso não calçar seus sapatos e caminhar nos seus passos, mas posso chorar sua dor. Posso me revoltar com seus versos subversivos ou me derreter com suas histórias de amor.   

Suas experiências são suas, assim como sua visão de mundo e suas emoções. Se você decidir expressá-las através da arte, pode acabar encontrando pessoas que se sintam tocadas por seu trabalho, seja por pensarem/sentirem de forma semelhante, ou por terem sido por ele cativadas. Por mais pessoal que seja seu trabalho, ele pode encontrar eco por aí. O mundo é grande, afinal!

Nós, seres humanos, somos mais parecidos do que imaginamos. Todos nós sentimos medo, alegria, esperança, dor, saudade, solidão, tristeza, raiva, amor. Todos nós questionamos no nosso íntimo o que queremos da vida, o que estamos fazendo dela e qual seu sentido. Talvez seja difícil para você explicar o que é saudade, mas pode haver uma música que represente ela para você. Talvez seja difícil descrever do que você sente medo, mas uma imagem pode vir em sua mente e você pode reproduzi-la no papel.

A arte pode tornar concreto o que é abstrato dentro de nós. Pode ajudar a entendermos a nós mesmos. A sua arte importa pois ela é expressão sua, da sua história de vida, do que te feriu ou te cativou, e pode ser uma maneira de você lidar com isso. Ela faz parte do seu mundo, e você não precisa ficar sozinho nele. Por isso ela deveria ser publicada, pois ao compartilhar com os outros, eles serão capazes de acolher, se transportar ou quem sabe até habitar nesses pequenos pedaços do seu mundo.

E, pensando por esse lado, talvez um artista seja então alguém que gostaria de ser menos solitário.

Porque sua arte é importante (e você deveria publicá-la)

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